Parte 3
Júlia entra no carro e se depara com uma rosa sobre o assento. Sorri.
- Você é um dos maiores predadores das rosas vermelhas.
- Mas é por uma boa causa. Só esse sorriso já valeu a pena. As rosas compreendem.
Eles se cumprimentam com um beijo no rosto. Ela sente o cheiro da loção pós-barba, ele do shampoo, do perfume e do hidratante. Perfeitamente diferenciáveis entre si.
Pedro liga o carro.
- Já escolheu o lugar?
- Desde que a vi naquela festa chata, com gente chata.
- Sei...
- Sério! Pensei imediatamente: tenho que levar esta mulher ao meu restaurante preferido.
- Certo, vamos a ele então.
***
O maître puxa a cadeira para Júlia. Ela olha em volta, com admiração. O lugar tem a aparência de um palácio grego, devia ser caríssimo. Se Pedro tencionava impressioná-la, fora bem sucedido. O ambiente era de um luxo esmagador. As colunas suntuosas e os uniformes impecáveis dos garçons fizeram Júlia pensar que deveria ter caprichado mais na produção.
Pedro lia o cardápio com uma familiaridade que lhe pareceu artificial. Júlia poderia apostar que era a primeira vez que ele entrava naquele restaurante.
- Você sempre vem a este lugar?
- Sempre. Desde os quinze anos... meus pais adoravam isso aqui. Eram amigos do dono. Viemos à inauguração. O garçom lançou um olhar risonho em direção a eles.
- Preciso retocar a maquiagem, já volto. Levanta-se e se dirige ao banheiro. Antes de entrar, pergunta ao barman:
- Este restaurante existe desde quando, senhor?
- Completa dois anos no mês que vem.
- Dois anos? Obrigada.
Júlia volta à mesa com um sorriso enigmático, que Pedro nota, mas teme perguntar a razão. Ele a serve do vinho que pediu. Provavelmente a garrafa mais cara do menu. Ele parecia empenhado na tarefa de impressioná-la. Tal pensamento a fez olhá-lo cinicamente e dizer:
- Desde que idade você disse vir aqui mesmo?
- Não lembro ao certo, acho que desde os quinze, ou antes. Mas sem nostalgia... Você esperava as flores?
- Não... na verdade você nem deveria ter o meu endereço.
- É, temos amigos alcoviteiros em comum.
- Eles vão levar uma bronca.
- Vão?
Sorve o vinho e o olha provocadoramente.
***
A caminho do carro Pedro coloca o braço em volta da cintura de Júlia. Com a mão na maçaneta, hesita. Encosta-a ao carro e afaga seus cabelos.
- Não é ético se aproveitar de uma mulher bêbada.
- Eu nunca disse que sou ético.
Beijou-a longamente, pressionando seu corpo contra o dela, ofegante. Júlia o afasta gentilmente com as mãos sobre seu peito.
Pedro posiciona seus lábios junto ao ouvido dela e sussurra:
- Você esteve linda a noite toda. Perfumada, graciosa, atraente... não sabe o esforço que eu fiz pra me controlar.
- Imagino. Agora me leva pra casa?
Ele a olha sem entender. Ela abre a porta do carro, entra e coloca o cinto de segurança.
***
- Se eu me oferecer para entrar, você se ofende?
- Não, mas não aceito. A noite foi ótima, o vinho e o jantar estavam excelentes. O restaurante é adorável e você foi muito atencioso e cavalheiro.
- Posso te ligar?
- Se quiser, pode sim. Boa noite.
O som da porta do carro se fechando e em seguida o da porta da casa dela, que sequer olhou para trás, ficaram ecoando em sua mente. O trajeto para casa foi automático. Não entendera nada. Como ela podia mudar assim em frações de segundo? Talvez fosse melhor mudar a estratégia. Ser gentil demais não funcionara bem.
***
Com o removedor de maquiagem numa mão e o telefone na outra, Júlia narra a uma amiga a sua mais recente peripécia anti-romântica e gargalha.
- É, querida, resolvi experimentar novos métodos. Os antigos já não me satisfazem mais.