sexta-feira, 24 de abril de 2015



Estava nostálgica. Não saudosa, apenas nostálgica. Gostava deste sentimento. Porque só o que era bom voltava à memória. Não lembrava das brigas homéricas por tudo e por nada. Da tentativa de controlar sua roupa, a direção do seu olhar e até seu pensamento. Quando ficava nostálgica recordava os primeiros meses. Os melhores. Ele ainda se esforçava em disfarçar seu ciúme e quando deixava escapar, ela achava até charmoso. O charme desapareceu na primeira ameaça. Ele a censurava em tudo. E ela que sempre fora tão dona de si, parecia uma criança obedecendo a seu pai cegamente. Por sorte, a cegueira só dura até o último suspiro do amor. A voz, os ataques de ciúme, o tom autoritário, tudo nele a exasperava. Até que com o dedo em riste, ela disse enfim:

- Não quero mais você e não venha atrás de mim.

Ainda ouviu ele dizer:

- Eu vou te matar.

Olhou sorrindo sarcasticamente sobre o ombro e respondeu:

- Se eu não te matar primeiro.

O amor é mesmo um sentimento volúvel, pensou, agora, admirando o corpo dele caído na sala do seu apartamento, encharcando de sangue o carpete. Acendeu um cigarro.