quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

A fotogenia da tristeza



A alegria, por mais beleza que traga em si, jamais vestiu tão bem a literatura quanto a tristeza. Essa última, evidentemente, sempre acompanhada de seus parceiros indissociáveis: a passionalidade, o desespero e a solidão, também extremamente belos e fotogênicos num álbum literário.
A euforia que a alegria representa, ainda que em maior ou menor escala, jamais será páreo para uma cena de abandono, para a profunda solidão que segue o som de uma porta se fechando, para o pranto visceral incomparável a um choro de felicidade.
O incesto cometido pelas almas-irmãs - literatura e tristeza - é vital e essencial para que a literatura, como arte, atinja, comova, corroa e afete perpetuamente seus leitores.
Estou corroída até a alma. Não há mais salvação. E se houvesse, eu a daria de presente de natal tardio ao primeiro que passasse.

PS.: Em um comentário no Do Amor, Laico Impropério, de Edgar Sollers, eu disse que a tristeza e a literatura são almas-irmãs que cometem incesto - ou algo que o valha. Ele, o Sollers, afirmou acreditar que essa frase mereceria um post. É, eu resolvi acatar a idéia. :)

24 comentários:

Edu Guimarães disse...

Acho que a felicidade e a alegria não conseguiriam alimentar a literatura, nem com idéias nem 'comercialmente'. Sem contar que, geralmente, os melhores livros, textos, músicas, são aqueles que traduzem o 'outono' da alma.

Mila disse...

Quando se está alegre, satisfeito, completo a vontade de escrever não vem com a mesma intensidade de quando se está amargurado e incompleto.
As melhores produções literárias são, desde sempre, fruto do desespero de quem se arriscou a expôr sua dor.
E quer dor mais linda e dolorida do que a dor de amor?!

Beijos

La Maya disse...

Linda a foto e genial a frase que deu origem ao post... Concordo com o Sollers!

"corroída até a alma"... Conheço o sentimento. Mas também acredito que os amores se sucedem. Nenhum substitui outro, mas todos eles vão deixando pedras (preciosas ou não) que se encaixam na construção daquilo que somos. Escadas que vão subindo e nos ensinando a amar. E ser amados.

Beijos e um ótimo começo de ano pra você!

Anônimo disse...

Sem dúvida nenhuma merecia um post mesmo!!
E é bem verdade. É bem isso mesmo.

Dizem que a tristeza é mais 'fácil' porque é resignação. Vai ver é tbm uma forma de escancararmos nossa dor sem mais facilmente. Ficamos mais sensíveis, provavelmente.


Adorei o post.

E que 2008 seja maravilhoso!! =]


Beijo, Jô.

Eduardo Trindade disse...

Muitíssimo bem colocado, como de hábito. E eu concordo contigo. Não só porque a tristeza, em todas as suas formas, é mais plástica... Mas também porque quem está triste sente vontade de desabafar sua tristeza, enquanto que quem está feliz está ocupado demais com sua própria felicidade.
E, no entanto, eu, que às vezes crio coisas tristes, me sinto tão bem com obras mais alegres! Afinal, tudo por um sorriso a mais na constelação deste mundo...
Abraços!

Camila... disse...

O que seria dos poetas se não fosse a agonia desesperada de um amor não correspondido? Não só a poesia, mas a música também se baseia, na maioria das vezes, na tristeza, na solidão e no desamor.

Isso me faz lembrar "Nervos de Aço", de Lupicínio Rodrigues, para mim uma das canções mais tristes do mundo:

Você sabe o que é ter um amor, meu senhor
Ter loucura por uma mulher
E depois encontrar esse amor, meu senhor
Nos braços de um tipo qualquer
Você sabe o que é ter um amor, meu senhor
E por ele quase morrer
E depois encontrá-lo em um braço
Que nenhum pedaço do meu pode ser
| Há pessoas com nervos de aço
| Sem sangue nas veias e sem coração
| Mas não sei se passando o que eu passo
| Talvez não lhes venha qualquer reação
Eu não sei se o que trago no peito
É ciúme, despeito, amizade ou horror
Eu só sei é que quando a vejo
Me dá um desejo de morte ou de dor

Linda, dolorida, sensacional.

Beijão, mocinha!
Um ano repleto de momentos memoráveis e inspiradores pra vc!

Vinícius disse...

.

concordo demais com isso...

mas devo dizer que embora na literatura funcione bem melhor, na vida real, de onde a literatura é, por vezes, reflexo, é bem mais belo, estética e sentimentalmente, a alegria...melhor dizendo, a felicidade.

forte abraço
e FELIZ ANO NOVO.

.

Anônimo disse...

... e ficou um pelo post. Num belo blog.
Em 2008 quero vir mais aqui.

Feliz Ano Novo!


Abs do Nil

Anônimo disse...

Jô, muitas e muitas coisas maravilhoas para você.
Que 2008 seja só o começo de tantas realizações.


E que a inspiração continue gritante!!


Beijoos =]

Jô Beckman disse...

Feliz ano novo de Jô para Jô!
sucesso!
beijos

Lily disse...

Sem dúvida, a tristeza é mto bonita, qndo não fazem dela algo piegas...

Mas, msm assim, abandonemos a beleza da tristeza em 2008, hein! Afinal, beleza não põe mesa! ehehehehe

Bjksss

fjunior disse...

sabia decisão... e o tema daria uma tese de mestrado-doutorado... pois é um debate profundo... capaz de levantar sérias questões...

Luana! disse...

A minha felicidade se descarrega em prosas melancólicas.

Muadiê Maria disse...

Interessante sua observação.
Penso que é mais que a tristeza,
o que não entendemos é que nos intriga. E muito do que não entendemos nos traz dor e tristeza.

Gostei muito de seu espaço. Feliz 2008.

Anônimo disse...

É interessante como a senhorita se coloca sempre como uma mulher encantadora, inesquecível, despudoradamente amável, e os homens uns tolos, covardes, bobos, sempre pedindo atenção, mendigando carinho. Isso me lembra muito o gênio Nelson Rodrigues, meu autor predileto entre os brasileiros dos anos 1950, embora soe um auto-elogio meio brega quando menciona a si, no entanto é o de menos por aqui. Percebo uma violência agudan no trato com os tipos masculinos (seria vingança?) e a mesma complacência com a mulheres, embora os iletrados e ignorantes achem o contrário do nosso grande dramaturgo e profundo conhecedor da alma feminina ("nem todas as mulheres gostam de apanhar, só as normais!"). Deixemos pra lá comentários pseudo-profundos e literatices chatérrimas. Deixemos pros profissionais e estudantes de letras que circulam por aqui.

Bom texto, Jô.

a) Leitor.

disse...

Meu caríssimo Leitor... agradeço parte das coisas que escreveu, embora outra parte me seja um tanto desagradável de ler, gosto de críticas... bom, mas não sei se vc leu tudo o que comentou, caso não o tenha feito, adianto que eu não "me coloco" como uma mulher encantadora, inesquecível etc. Primeiro, a maior parte dos textos é ficcional (e acho que isso não só os alunos de letras notaram) e os que não o são, não necessariamente são autobiográficos, portanto, não me entenda como uma pessoa autoelogiosa, isso foi inferência sua. Os únicos textos não inteiramente ficcionais, o que tbm não significa que não sejam alterados, são os que pertencem ä série DOs Diálogos Memoráveis e no primeiro post da série eu expliquei que se tratariam de diálogos vividos por mim ou que me foram narrados, ou seja, vc está tirando suas conclusões baseado em impressões suas, cuidado pra não se enganar.

Agradeço a visita e vc está convidado a aparecer sempre que quiser. À vontade. Só gostaria que se identificasse, para que eu não fique a falar com quem não sei, embora faça alguma idéia,acho, quem é.

La Maya disse...

Olha! Fomos elevados ao status de estudantes de Letras é? Coisa boa...

Anônimo disse...

Cara Jô,

Que bom que tenha acatado a minha sugestão. Fica o belíssimo post, com uma belíssima imagem e um belíssimo título. Poderia ser maior, sim, mas a essência ficou transparente. E isso já basta.

Que 2008 continue cheio de letras para você! Fico te devendo uma visita para ler os posts mais recentes...

Anônimo disse...

Cara autora.

Meus comentários não tinham a intenção de desgradá-la. Perdoe-me. É apenas uma comparação com um dos meus autores preferidos. Nas entrelinhas, sua verve me fez tão bem quanto a dele ou ainda está tão boa quanto a do nosso Nelson.

Quanto ao auto-elogio, não se melindre. Ser ou não inesquecível e encantadora depende dos olhos de quem vê, mas é bom termos segurança sobre nossas possibilidades humanas. Diria, um cínico, "se dizes, acredito", pura e simplesmente por não saber quem a senhora é, de fato.

Quanto a identificação, melhor permanecer com a essência do que sou por aqui, um leitor.

Não pude ler os novos textos. Quando puder terei prazer em fazê-lo.

Um grande abraço.

a) Leitor.

disse...

Vamos lá... em relação ao suposto autoelogio, acho que vc continua não entendendo, mas se reler o meu comentário posterior ao seu com boa vontade, sei que conseguirá. ;)

Se vc não me conhece mesmo, não vejo pq não se identificar, mas tudo bem, se isso o faz mais feliz, fique à vontade, moço. :)

Bem, se vc não tinha intenção de desagradar, então estamos entendidos. Assunto encerrado.

Até breve.

Anônimo disse...

Sim, encerrado. Só destacando a parte do auto-elogio que não quer dizer necessariamente ruim. Talvez o problema surgiu no "meio brega", o que também não é de todo mau. Uma peleja filosófica que deve ser regada à boa cerveja ou, quem sabe, um vinho, mas nunca por aqui por essas bandas virtuais. Grandes autores quando exprimem certas características em seus personagens também estão falando de si. Não apenas em se tratando de virtudes, mas de defeitos também. Os insumos primeiros da literatura são a condição humana e as fantásticas experiência que isso possibilita e blábláblá. =]

Desfeito o ranço da discórdia, deixo-lhe um abraço fraterno e reteiro a admiração por suas letras.

b) Leitor.

disse...

Entendo o que disseste, mas insisto em discordar... acho que se todos os personagens fossem direta ou indiretamente baseados no próprio autor, todos os escritores seriam repetitivos demais. Acredito na ficção, na criação, na inspiração. E quando vc usa o termo 'condição humana', isso resume tudo o que eu acho que a ficção representa. Mas isso de forma alguma ligado a uma pessoa específica, mas ai ser humano, em linhas gerais.

Bem, são posicionamentos diferentes sobre uma mesma coisa. Isso é saudável.

Vc tbm vive em Pasárgada? Se viver, marquemos o vinho.

Anônimo disse...

Que bom que nos entendemos.

Moro um pouco distante.
Mais perto de Macondo e Cartagenas de las Índias, vizinho das tragédias e alegrias da região.

Abraço.
h) Leitor.

Liz Ramos disse...

Adorei este blog!