segunda-feira, 9 de abril de 2012

"Antes de embarcar em uma vingança, cave duas covas" (Confúcio)



(Texto escrito em parceria com Katy Cordeiro)


A noite chuvosa parecia refletir seu estado de espírito. Andava descontroladamente de um lado ao outro do quarto já nervoso com a espera que aparentava, como toda espera, ser muito mais longa do que era de fato. Ela era sempre pontual, mas hoje se atrasara por mais de uma hora.
O céu estava avermelhado de tão cinza, tal qual a sua consciência inundada de culpa. O medo de ser abandonado misturava-se indissociavelmente à ansiedade para vomitar seu discurso mais do que ensaiado.
Olhava-se no espelho a fim de ocultar qualquer rastro de culpa, quando bateram à porta.
Ele, sabendo de quem se tratava, abriu sem cerimônia.
Ela, sem guarda-chuva ou indícios da chuva em sua roupa, entra ofegante e solta somente um “oi” pálido, com um olhar enviesado.
Ele diz: - Fica à vontade, vamos conversar. Senta-se a sua frente com pavor de que seu texto lhe fugisse da memória, inicia aquilo que mais estava para um duelo que para um diálogo:
- Bom, eu queria comecar dizendo que...
Interrompendo-o como alguém que se atira na frente de um caminhão, diz: - Não tem jeito, acabou! Vamos nos poupar dos discursos prontos.
- Mas eu juro que ela não significou nada! Foi coisa de momento! Não foi premeditado!
- Não adianta, acabou!
- Não consigo entender, eu sei que errei, me dê uma chance, por favor! Não a conheci intransigente assim...
- Intransigente? Então com isso você quer me dizer que se fosse o contrário, você me perdoaria?
- Sim.
- Você tem absoluta certeza disso?
- Claro, eu a amo, mas você não é capaz de me perdoar, não é?
- Sou.
- Então por que não acabamos com isso de uma vez?
Ele, já com o alívio lhe descendo pelo peito, tenta abraçá-la. Ela o impede e depois de um longo silêncio completa:
- Eu até posso perdoar, mas você não conseguirá. Só precisei atravessar o corredor pra vir até aqui. Dormi com o Marcos, mas se isso te traz algum alívio... ele não significou nada.
- Como você pôde? Ele é um irmão pra mim!
- Eu não pus uma arma na cabeça dele.
- ,,,
- E agora? Dois pesos, duas medidas?
- Saia da minha casa.

Já na rua, ela sentia a chuva molhar seus cabelos e o frio aumentar. Naquela noite, ela não se sentiu melhor como achou que se sentiria.

5 comentários:

Anônimo disse...

Sei como é isto. No fundo toda vigança é uma maneira de se auto-flagelar. Clarisse.

Jessica Moraes disse...

aí complica hein? adoro as retratações que você faz aqui... para sentir e pensar...

Vanessa Raiol disse...

Alguns pratos "frios" perdem o sabor.

Fear Itself disse...

Alguns dos seus textos me dão mais medo do que os que eu escrevo rs. Tenso. Mas gosto muito e não consigo deixar de ler, não sei o que houve porque nunca mais apareceu atualização sua lá para mim =/
Perdi muita coisa! Vou por em dia...um beijo!

Cris Carvalho disse...

Lindeza!

beijocas de luz!

=)